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Nem tudo é cor de rosa

Cor de rosa nunca mais. 

Procurando o tom, encontro Vinicius, em uma esquina ou num bar qualquer do meu lugar. A palavra doce fantasia.
Um modo estranho de perceber que fantástico seria...
tudo sempre cor de rosa. 

 

Do dragão de São Jorge, ao pavão do Palácio de Cristal. O cavalo de Tróia, e aquele outro também... 

Mas cavalinhos azuis só giram em carrosséis.

O retrato das rodas flutuantes da mala na parede, esperando a hora de voltar. Para o outro lado do mar, um mar com ondas de Hiroshima...
Cor de rosa nunca mais. 

 

Escolher uma cor é como decidir que palavra usar para estruturar uma cena inteira. Isoladas, as cores não dão conta de expressar sensações complexas, tal qual acordes, como na música e na poesia. Em pintura, passamos muito tempo envolvidos nos estudos e experiências relacionados à cor. Depois tentamos dar uso a elas para recriar imagens escondidas em nossa memória. 

Nos últimos tempos escolhi pensar o trabalho a partir de uma cor específica: a cor de rosa. Pareceu-me adequado este matiz para compor o cenário fantástico e inexplicável dos tempos recentes. 
 

Da memória, esta cor trouxe flashes de um poema musicado que aborda o contraste entre o trágico e o afetuoso presentes em uma imagem. Seu autor, o poeta Vinícius de Moraes (Rio de Janeiro, 1913 – 1980), exportou para muitos lugares uma cultura onde o amor figurava como uma das principais bandeiras. 
 

Em 1946, Vinícius de Moraes compôs o poema Rosa de Hiroshima, onde cria uma metáfora que associa a imagem da bomba que dilacerou toda uma população à figura de uma rosa.
 

“... Mas, oh, não se esqueçam Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária 

A rosa radioativa...”
 

Neste portfólio apresento pinturas de diferentes séries, que foram selecionadas tanto pelo cromatismo, quanto pela temática. Imagem, movimento e memória são dimensões da pesquisa que se desdobram em questionamentos sobre migração e morte nestas pinturas. A Rosa de Hiroshima inspira o contraponto percebido nestes trabalhos, pautados tanto pelo cromatismo distinto, quanto por uma aproximação entre tempos de dificuldade extrema, onde não se vê uma luz no fim do túnel. 

Odette Boudet, 2021 

 

 

Declaraçāo da artista

Uma palavra norteia o meu trabalho e define a sua essência: imagem. A magia do mundo das imagens sempre me encantou. Para mim, no princípio não havia o verbo, mas as fotografias. Nasci em um tempo em que as imagens veiculadas pelos meios de comunicação guardavam um certo mistério e nos deleitavam com suas histórias em outdoors, na televisão e no cinema. Creio que ainda eram “inocentes”. As matérias pagas dos jornais naquela época não tinham o impacto das atuais Fakenews. A pintura veio depois. E a simbiose entre estes dois suportes da memória, fotografia e pintura, continua presente em meu processo artístico. 
 

No início de minha trajetória, explorei a abstração das formas como um meio de compreensão de como a imagem surgia na tela branca, ainda por pintar. Os rastros das pinceladas, percebidos pelo acúmulo de matéria nas obras recentes, têm origem nas séries Arena, Construir e A cidade é transparente, produzidas em 2013 e 2014, quando eu buscava representar materiais como o vidro e o concreto aparente, utilizados na arquitetura urbana contemporânea. 
 

Em 2015, quando passei a investigar a pintura a óleo, senti a necessidade de experimentar a figuração. O formalismo deu lugar a novos questionamentos. Entender de que forma certos objetos do cotidiano podem representar sensações humanas tornou-se uma preocupação fundamental em minha pesquisa. As facas e espadas serviram de modelo vivo até o ano de 2019, insinuando possíveis significados por trás de seus corpos. 
 

O tema das malas, recorte da minha pesquisa atual, abres as portas para conceitos relacionados à memória afetiva, migração e transitoriedade. O novo objeto traz consigo a ideia de que “O movimento das imagens é semelhante ao dos seres humanos, elas migram, são portadoras de conceitos e de emoções. As imagens transportam consigo a história do mundo”. 

 

Biografia 

Odette Boudet é uma artista visual natural do Rio de Janeiro. Vive e trabalha entre Brasil e Portugal desde 2018. Formada em cinema, iniciou seus estudos em pintura em 2011, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Frequentou a Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, entre 2016 e 2017. 
 

É aluna do mestrado em Artes Visuais na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. No Brasil, realizou as exposições no Espaço de Moda Lilás, em Armação dos Búzios-RJ (2015), Hostel Contemporâneo – Botafogo-RJ, com a curadoria de Isabel Portela (2016) e participou do II Festival de Arte Contemporânea de Rio das Ostras-RJ (2019). 
 

Em Portugal, participou de exposições na galeria Espaço Q Quadra Soltas -Porto, Museu do Vinho - São João da Pesqueira, Casa de Cultura - Paredes (2019) e também em oMuseu da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e XXXIV Exposiçāo Colectiva dos Sócios da Cooperativa Árvore - Porto (2020). Expõe em ambiente virtual na Coletiva EIXO 2020, Niterói-RJ. 
 

No início de 2021, apresenta pinturas no projeto Mostra Tua Arte, projetadas em fachadas de prédios de Belém do Pará, no Brasil, e o texto “Travelling, um estudo do movimento que cruza as telas do cinema e da pintura”, em uma comunicação no Seminário Reflexão e Processo da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Neste ano o projeto Inércia é apresentado na coletiva EIXO 2021, Niterói-RJ. É selecionada para a VI Exposiçāo Internacional Museo Virtual MundoArD, Valência- Espanha e para a X Bienal de Pintura de Pequeno Formato, Moita-Portugal. 
 

Seu interesse atual se concentra na memória afetiva dos objetos, sua imagem e movimentos migratórios, bem como nas relações entre o cinema e a pintura. 

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